Martensita: Formação, Microestrutura e Impacto nas Propriedades do Aço

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Definição e Conceito Fundamental

A martensita é uma fase microestrutural supersaturada e metastável formada em aços e outras ligas através de resfriamento rápido ou têmpera a partir do campo de fase austenítica. É caracterizada por uma microestrutura altamente distorcida, semelhante a agulhas ou placas, que confere dureza e resistência excepcionais ao material.

No nível atômico, a martensita resulta de uma transformação de cisalhamento sem difusão da austenita cúbica de face centrada (FCC) em uma estrutura cúbica de corpo centrado (BCC) ou tetragonal de corpo centrado (BCT). Essa transformação envolve um movimento coordenado e coletivo de átomos, preservando a composição geral, mas alterando drasticamente a rede cristalina.

Na metalurgia do aço, a martensita é fundamental porque fornece um meio para alcançar alta resistência e dureza através de tratamento térmico controlado. Sua formação e manipulação são centrais para o desenvolvimento de aços de alta resistência avançados, ferramentas resistentes ao desgaste e componentes estruturais que exigem propriedades mecânicas específicas.

Natureza Física e Características

Estrutura Cristalográfica

A martensita em aços adota predominantemente uma estrutura cristalina tetragonal de corpo centrado (BCT), que é uma forma distorcida da rede BCC. A transformação da austenita FCC envolve um mecanismo de cisalhamento que resulta em uma distorção da rede caracterizada por uma razão de tetragonalidade (c/a) que normalmente varia de 1,00 (BCC) a cerca de 1,02–1,05, dependendo do teor de carbono.

A disposição atômica apresenta uma rede densa e compacta com átomos organizados em uma configuração BCT, que difere da estrutura FCC da austenita original. A transformação envolve uma relação de orientação específica, comumente as relações de Kurdjumov–Sachs ou Nishiyama–Wassermann, ligando a orientação da martensita à da austenita original.

Cristalograficamente, a transformação martensítica é caracterizada por um processo dominante de cisalhamento e sem difusão que preserva a composição geral, mas resulta em uma microestrutura altamente tensionada e internamente gêmea. Essas relações de orientação facilitam características cristalográficas previsíveis e influenciam o comportamento mecânico subsequente.

Características Morfológicas

A martensita se manifesta como uma microestrutura fina, acicular (semelhante a agulhas) ou em placas dentro da matriz de aço. O tamanho das placas ou lâminas martensíticas individuais normalmente varia de 0,1 a 2 micrômetros de espessura, com comprimentos que se estendem até vários micrômetros, dependendo das taxas de resfriamento e da composição da liga.

Na microestrutura, a martensita aparece como regiões escuras e alongadas sob microscopia óptica após a corrosão apropriada, frequentemente formando uma morfologia característica de lâmina ou placa. A distribuição pode ser homogênea ou concentrada em regiões específicas, especialmente em aços temperados ou parcialmente transformados.

Microestruturas martensíticas tridimensionais frequentemente exibem uma rede complexa de placas ou lâminas que se cruzam, com altas densidades de deslocação e tensões internas. A morfologia influencia propriedades como tenacidade, ductilidade e distribuição de tensões residuais.

Propriedades Físicas

A martensita exibe dureza excepcional, frequentemente excedendo 600 HV (dureza Vickers), devido à sua rede BCT distorcida e alta densidade de deslocação. Sua densidade é ligeiramente maior do que a da ferrita ou perlita, tipicamente em torno de 7,8 g/cm³, devido ao empacotamento atômico denso e átomos de carbono ocupando locais intersticiais.

Magneticamente, a martensita é fortemente ferromagnética, semelhante à ferrita, o que a torna detectável por métodos de teste magnético. Sua condutividade elétrica é relativamente baixa em comparação com fases mais macias, devido à alta densidade de defeitos e dispersão de impurezas.

Termicamente, a martensita possui um alto coeficiente de expansão térmica e condutividade térmica relativamente baixa em comparação com ferrita ou cementita. Essas propriedades influenciam as respostas ao tratamento térmico e o desenvolvimento de tensões residuais.

Comparada a outras microestruturas como perlita ou bainita, a alta dureza e resistência da martensita são compensadas por sua fragilidade e baixa ductilidade, necessitando de têmpera ou outros processos de tratamento posterior para otimizar o desempenho.

Mecanismos de Formação e Cinética

Base Termodinâmica

A formação da martensita é governada pela estabilidade termodinâmica da fase austenita em relação à martensita. Em altas temperaturas, a austenita é estável, mas o resfriamento rápido desloca o equilíbrio de fase, suprimindo transformações controladas por difusão e favorecendo uma transformação de cisalhamento sem difusão.

A diferença de energia livre (ΔG) entre austenita e martensita determina a força motriz para a transformação. Quando o sub-resfriamento abaixo da temperatura de início da martensita (Ms) excede um limite crítico, a transformação se torna termodinamicamente favorável.

Diagramas de fase, especialmente o diagrama de fase binário Fe–C, delineiam as faixas de temperatura e composição onde a formação de martensita é possível. As temperaturas de início (Ms) e fim (Mf) da martensita definem a janela cinética para a transformação durante a têmpera.

Cinética de Formação

A cinética da formação da martensita é caracterizada por uma transformação rápida e dominante de cisalhamento que ocorre em milissegundos a segundos, dependendo da taxa de resfriamento e da composição da liga. O processo envolve a nucleação de variantes martensíticas em locais favoráveis, como limites de grão ou deslocações, seguido por um crescimento rápido.

A nucleação é tipicamente homogênea ou heterogênea, com a taxa influenciada pela temperatura, microestrutura anterior e elementos de liga. O crescimento ocorre por meio de um mecanismo de cisalhamento, com camadas atômicas se deslocando coletivamente para produzir a rede BCT.

O passo que controla a taxa é frequentemente o processo de nucleação, com barreiras de energia de ativação associadas à transformação de cisalhamento. A taxa de transformação aumenta com um maior sub-resfriamento abaixo de Ms, levando a microestruturas mais finas.

Fatores Influentes

Elementos de liga como carbono, manganês, níquel e cromo influenciam significativamente a formação da martensita. O carbono estabiliza a martensita, elevando as temperaturas Ms e Mf, promovendo assim uma formação mais fácil em taxas de resfriamento mais altas.

Parâmetros de processamento, como a taxa de resfriamento, são críticos; a têmpera rápida a partir da temperatura de austenitização é essencial para suprimir a difusão e favorecer a transformação martensítica. O resfriamento mais lento permite a formação de outras microestruturas como perlita ou bainita, inibindo a martensita.

Microestruturas pré-existentes, como o tamanho do grão de austenita anterior e a presença de austenita retida, também afetam a nucleação e o crescimento da martensita, influenciando sua morfologia e distribuição.

Modelos Matemáticos e Relações Quantitativas

Equações Chave

A fração de martensita formada durante a têmpera pode ser estimada usando a equação de Koistinen–Marburger:

[ f_M = 1 - \exp$$-\alpha (M_s - T)$$ ]

onde:

  • ( f_M ) = fração de volume de martensita,
  • ( \alpha ) = constante específica do material (~0.011 para aços),
  • $M_s$ = temperatura de início da martensita,
  • ( T ) = temperatura durante o resfriamento.

Essa equação assume uma relação linear entre o sub-resfriamento abaixo de Ms e a quantidade de martensita formada, aplicável para condições de resfriamento rápido.

A temperatura Ms em si pode ser aproximada com base na composição química usando fórmulas empíricas, como:

[ M_s (°C) = 539 - 423C - 30.4Mn - 17.7Ni - 12.1Cr - 7.5Mo ]

onde as concentrações estão em porcentagem de peso.

Modelos Preditivos

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